Pequenos comerciantes suprem falta de crédito de
bancos nas periferias
Dois cadernos grandes, de
espiral, estão à mão no caixa do mercadinho de João Paulo Santos Silva numa
favela brasileira. Páginas e páginas de números com um singelo nome anotado
logo acima. Na maior parte das folhas, não há nenhuma menção a sobrenomes.
Assim funciona o sistema de
crédito a um grupo de 50 clientes que podem comprar fiado no mercadinho de João
Paulo. Juntos eles representam 30% do faturamento. Apesar de não ter um
controle tão rígido dos calotes, ele sabe que alguns clientes estão pagando
menos que 50% do que devem a cada mês. Não tem juro nem renegociação, apenas a
esperança de que o pagamento seja feito em algum momento.
"A concorrência é muito
grande", diz timidamente em meio ao entra e sai que numa quinta-feira à
tarde é constante. "Mas não faço fiado para qualquer um não, tenho de
conhecer o freguês". Mas João Paulo já está no seu limite de crédito a
clientes e não aceita mais nenhum freguês para comprar fiado.
O mercadinho no meio da favela é
só um exemplo de como o fiado ainda resiste no Brasil, apesar da proliferação
do uso de cartão de crédito e das compras parceladas de grandes redes
varejistas.
Entre os mais pobres, o
porcentual de uso de fiado é de 16,3%, segundo a pesquisa da Fundação Bill
& Melinda Gates, analisada pela FGV. Entre os mais ricos, o porcentual não
chega a 8%. O fiado acaba sendo uma forma de suprir a classe mais pobre da
falta de crédito em bancos.
A pesquisa também constatou que
ainda é baixa a penetração do microcrédito, que atende justamente à população
mais pobre. Em geral, os bancos, apesar de investirem em programas,
principalmente com o uso de agentes que circulam nas periferias das grandes
cidades, acabam se mantendo dentro das exigências das regras do Banco Central
de que 2% dos depósitos à prazo estejam em microcrédito.
O Itaú, por exemplo, tem uma
carteira menor que R$ 400 milhões e trabalha basicamente com agentes no Sul e Sudeste.
O Santander acaba se destacando com uma carteira de R$ 2 bilhões e recentemente
inaugurou uma agência na favela de Paraisópolis, que fica no outro extremo de
onde está Heliópolis. O banco mantém uma taxa de inadimplência baixa, de 7%.
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