Um dos desafios para tornar esses organismos uma alternativa comercialmente viável para a produção de biodiesel é aumentar sua eficiência fotossintética, que é duas a três vezes inferior ao potencial do vegetal.
“O aumento da taxa de fotossíntese de microalgas para a produção de biodiesel tornou-se uma questão crucial na pesquisa em biocombustível”, disse Angela Pedroso Tonon, pesquisadora da divisão de Biociências do Los Alamos National Laboratory, dos Estados Unidos, à Agência FAPESP.
“Ao aumentar a capacidade de absorção de energia solar por esses organismos é possível elevar a fixação de CO2 [dióxido de carbono] e produzir maior quantidade de moléculas orgânicas, como carboidratos. Esses carboidratos podem ser transformados em proteínas, aminoácidos e, principalmente, óleos”, explicou a pesquisadora, que realizou mestrado e pós-doutorado com Bolsa da FAPESP.
Um grupo de pesquisadores do centro de pesquisa em microalgas do laboratório pertencente ao Departamento de Energia dos Estados Unidos (DOE, na sigla em inglês) – do qual Tonon é integrante há três meses – desenvolveu e está cultivando cepas de microalgas geneticamente modificadas capazes de realizar fotossíntese com maior eficiência do que organismos selvagens (que não sofreram mudanças genéticas).
Os resultados do estudo foram relatados em um artigo publicado na revista Algal Research e apresentados por Tonon em palestra realizada no dia 10 de outubro na Advanced School on the Present and Future of Bioenergy, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
“Os resultados da comparação das cepas de microalgas geneticamente modificadas com as selvagens indicaram que elas apresentam melhor desempenho fotossintético e maior taxa de crescimento do que as cepas que não foram geneticamente modificadas”, afirmou Tonon.
Modulação das antenas – De acordo com a pesquisadora, para realizar a fotossíntese as plantas e as microalgas utilizam centros de captação de luz solar – chamados de “antenas” –, compostos por pigmentos como clorofila. Esses pigmentos absorvem a energia luminosa e a transferem para o fotossistema da planta a fim de produzir moléculas energicamente ativas que ajudam na fixação de CO2 e, consequentemente, na produção de carboidratos.
Ao serem expostos a uma grande quantidade de luz, como no verão, por exemplo, esses centros de captação de luz solar ficam muito saturados e não realizam de forma eficientemente coordenada a captura de fótons e a transferência de elétrons para fixar carbono.
Por essa razão, as plantas perdem uma quantidade significativa de energia da luz captada na forma de calor ou de fluorescência que poderia ser utilizada para aumentar a fixação de CO2 ea produção de carboidratos, como açúcares, entre outras moléculas.
Embora as microalgas, que possuem grandes antenas de captação de luz, sejam muito eficientes na captura de fótons, elas não são tão produtivas quando estão juntas com outras microalgas.
Quando estão na superfície da água, elas captam mais energia da luz solar do que são capazes de usar para fixar carbono e dissipam o excesso de energia para as microalgas abaixo da superfície.
“Não adianta a planta ter uma grande quantidade de pigmentos se, quando absorve a luz, não a transfere e converte toda a energia física da luz capturada em energia química porque o fotossistema satura”, avaliou Tonon.
Para aumentar a eficiência da fotossíntese desses organismos, reduzindo o desperdício de energia solar e levando as microalgas da superfície e das camadas mais profundas a absorver todos os fótons, os pesquisadores do laboratório norte-americano começaram a modular o tamanho das antenas de captação de luz de microalgas das espécies Chlamydomonas reinhardtii e Chlorella sorokiniana, entre outras.
Com isso, o processo de fotossíntese é realizado de forma mais uniforme por diversas microalgas cultivadas em tanque, por exemplo.
“A ideia é modular o tamanho da antena das microalgas, diminuindo ou aumentando a quantidade de pigmentos, de acordo com a estação do ano”, disse Tonon.
“Durante o verão, quando há uma alta incidência de raios solares, a antena das microalgas não precisa ter uma grande quantidade de pigmentos. Já durante o inverno, quando a energia solar é menor, ela captará mais energia se a quantidade de pigmentos for maior. Dessa forma, poderíamos fazer um ajuste das cepas transgênicas nas diferentes estações do ano”, explicou.
Controle da clorofila b – Para modular o tamanho das antenas, os pesquisadores diminuíram os níveis de “clorofila b” nos organismos.
O pigmento absorve luz em um comprimento de ondas diferente do que a “clorofila a”, também presente nas microalgas e em outros organismos vegetais. Com isso, a “clorofila b” absorve e transfere mais energia solar que outros pigmentos, explicou Tonon.
“Ao regular a produção dessa clorofila, é possível controlar o tamanho da antena das microalgas”, detalhou.
Para fazer essa regulagem, os pesquisadores modularam a expressão de um gene responsável pela síntese do pigmento – uma enzima chamada “clorofila a oxigenase”.
Diminuindo a expressão do gene dessa enzima e, consequentemente, a quantidade de “clorofila b” no sistema, eles geraram algas com diferentes capacidades de absorção de luz.
As culturas de algas transgênicas apresentaram taxa de fotossíntese duas vezes maior do que as cepas selvagens, medida pela produção de oxigênio durante o processo fotossintético.
Além disso, tiveram crescimento 30% maior também em comparação com as culturas que não sofreram modificação genética.
“Ao diminuir a produção de clorofila b na microalga, elas conseguiram aproveitar melhor a energia que capturam pela fotossíntese e transferi-la com maior eficiência, sem saturar o fotossistema nem causar danos”, disse Tonon.
“Quando as microalgas ou plantas absorvem muita energia e não conseguem distribuir de forma eficiente os elétrons, essa energia se acumula no fotossistema, causando uma série de danos, como a foto-oxidação”, explicou.
Doutorado em bioenergia – A Advanced School on the Present and Future of Bioenergy está sendo realizada no âmbito da Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA) – modalidade de apoio da FAPESP.
O evento reúne até sexta-feira (17/10), no Instituto de Química da Unicamp, pesquisadores, docentes e estudantes de graduação e pós-graduação do Brasil e do exterior para discutir o atual estágio e as perspectivas na pesquisa sobre bioenergia.
“A ideia do evento foi cobrir todos os aspectos relacionados à bioenergia e ressaltar que a matéria-prima para a produção de biocombustíveis e outros produtos químicos que podem ser gerados a partir de biomassa não se resume à cana-de-açúcar”, disse Andreas Karoly Gombert, professor da Unicamp e organizador do encontro.
Outro objetivo do evento foi promover o Programa Integrado de Doutorado em Bioenergia promovido conjuntamente pela Unicamp, Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Estadual Paulista (Unesp), cuja primeira turma iniciou em março.
“Como queremos atingir o maior grau de internacionalização possível e atrair estudantes de fora do Brasil para o curso aqui no país, achamos que o evento seria uma boa forma de divulgar o curso”, disse Gombert.
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